"A Bela e o Monstro" - o espetáculo de 2019 e um desabafo
São precisamente 02:27h enquanto escrevo esta primeira linha. Não tenho sono, o que é uma novidade nesta quarentena: geralmente, tirando os desconfortos típicos da gravidez, nada me tem impedido de dormir (quanto mais o fizer, menos horas passo em confinamento... um bocado triste, mas real). Fiquei na sala e, estando farta da televisão e do meu telemóvel, liguei o dispositivo eletrónico em que menos tenho estado para lazer: o computador. Liguei-o não percebi muito bem porquê, talvez na esperança de encontrar inspiração para escrever, mas não chegou, porque hoje foi um daqueles dias particularmente difíceis de estar aqui fechada e tenho a cabeça tão cheia de pensamentos quanto desprovida de inspiração.. Então fui ao Youtube e resolvi rever o espetáculo final de Dança do ano letivo passado: "A Bela e o Monstro de outras histórias".
Foram vários os momentos em que as lágrimas me correram pelos olhos, por dois motivos distintos, mas que se ligam entre si: uma nostalgia assoberbada de mais um espetáculo sentido e vivido com muito orgulho e amor, relembrando-me das saudades que tenho do meu trabalho; e por outro lado, por me lembrar daquilo que eu SOU e FAÇO, e que rezo poder voltar a SER e a FAZER a partir de outubro. Ao longo destes já 60 dias de quarentena, fui-me esquecendo voluntária e involuntariamente disso. E porque é que tal coisa aconteceu a alguém que respira o seu trabalho? A palavra é só uma: carapaça. Uma carapaça que construí para não me doer mais esta "prisão domiciliária". Quando percebi que as coisas estavam mesmo mal, estava a trabalhar. E apesar de já estarmos a tomar as devidas precauções e de eu calcular que teríamos de fazer umas férias da Páscoa maiores, nada me faria prever que a metade do meu dia, o Presidente do Clube onde dou os treinos viesse ter comigo para me informar que tínhamos de parar. Primeiro, por duas semanas obrigatórias, mas possivelmente por tempo indefinido. Pedi-lhe que me deixasse dar as aulas até ao fim daquele dia para poder falar diretamente com os meus alunos mais velhos e, sem ninguém saber, passei metade do meu "intervalo" a engolir as lágrimas no WC. Sabia que não seriam duas semanas. Um mês, pelo menos. E sabia que isso faria com que o espetáculo para o qual estávamos a trabalhar afincadamente este ano letivo ficasse sem efeito, pela falta de tempo. Era só nisso que pensava inicialmente quando me falavam em quarentena, naquilo que já tínhamos construído e que ficaria a meio (caramba, é bem pior do que nem sequer começar). Mas engoli em seco, prometi que ia aproveitar o tempo em casa para trabalhar na segunda parte do espetáculo, implorei que cumprissem as regras de isolamento caso as escolas também fechassem (nem disso tínhamos a certeza por esta altura) e fingi um ligeiro otimismo no que dizia respeito a regressarmos ainda este ano letivo. Eu própria, no fundo, queria acreditar... mas nunca aconteceu de facto. E outra coisa que nunca aconteceu, até à data, foi esse tal trabalho prometido da minha parte, porque ao tentar sequer ouvir as misturas musicais já criadas e treinadas, sentia uma urticária emocional gigante e optei por as excluir completamente da minha cabeça. Neste momento, nem sequer sei se o novo espetáculo, "Corcunda de Notre Dame", verá na mesma a luz do dia, no final do ano letivo 2020/2021 (as dúvidas são cada vez maiores). Mas, ainda assim, passaram 8 semanas e ainda não ouvi uma única música do trabalho já coreografado este ano, ainda não me debrucei um segundo neste computador em busca das músicas perfeitas para o efeito, ou sequer escrevi no papel várias hipóteses de enredo para a segunda parte. Frustração ao pensar sequer nisso é a única emoção que sinto de momento. Hipócrita, ainda criei desafios de dança para incentivar os meus alunos nestes dias de quarentena, mas para além de neste momento não me ser possível de participar também, admito que não o quereria fazer. "Faz o que eu digo, não faças o que eu faço." Que típico! Pareço a malta que foi festejar o 25 de abril e o 1º de maio.
E onde é que entra o espetáculo da "Bela e o Monstro de outras histórias" neste texto que já metade das pessoas desistiu de ler?
Foi o espetáculo mais recente que nós, DreamMakers fizemos. Mais um que nos demonstra que, com o poder do amor, o Sol volta sempre a brilhar, demore o tempo que demorar. E é nisso que temos de nos focar todos, agora.
Ficam algumas fotografias, que não fazem minimamente justiça a todo o trabalho realizado, mas fica bem representado. Para os vídeos, basta aceder AQUI à página de Facebook do projeto DreamMakers Crew.